domingo, 3 de março de 2013

Mal-estar na torre de marfim


Comentários ao artigo de Thomaz Wood Jr.: Mal-estar na torre de marfim (27.02.2013 10:04) 

Caros geonautas,
Gostaria de fazer um comentário ao belo e provocador artigo. O interessante é observar que, por um lado, as grandes corporações privadas de pesquisas científicas da área médica, só divulgam seus dados 5 anos após o lançamento, argumentam que é questão de se proteger da concorrência, por outro lado, as instituições pública de pesquisas médicas, tem como regra (pasmém), na qual qualquer artigo novo a ser publicado (paper), deve fazer referência a paper anteriores de no máximo 5 anos. Epa, tem boi na linha. O que temos de fato: um cartel?
Pano rápido, trocando em miúdos, esse mundo continua tão neoliberal como dantes no quartel de abrantes.
"Rapadura é doce mais não é mole não".
La nave va, 
Sds,

Site Carta Capital - Ciência para a Sociedade: Thomaz Wood Jr.: Mal-estar na torre de marfim (27.02.2013 10:04)  
The Lancet é uma das mais tradicionais, conhecidas e respeitadas publicações científicas da área médica. A revista foi criada pelo cirurgião inglês Thomas Wakley no primeiro quartil do século XIX. É o The New York Times das revistas acadêmicas: se lá foi publicado, é porque é verdade e deve ser lido, quase sempre…
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O ambiente acadêmico é um palco onde atuam diferentes grupos de interesse e as forças e pressões resultantes nem sempre conduzem aos nobres ideais sociais. Foto: Istockphoto
Além de publicar os mais relevantes estudos da medicina, a revista não se priva de assumir posições firmes e provocar polêmicas. Em 2003, um editorial propôs, sem meias-palavras, o banimento do tabaco no Reino Unido. Em 2009, a revista acusou o papa Bento XVI de distorcer evidências científicas para promover a doutrina católica sobre a castidade na prevenção da Aids. Um ano depois, um artigo da revista elegeu como alvo o álcool, acusando-o de causar problemas mais graves do que aqueles provocados por algumas drogas ilícitas.
Agora um editorial publicado no início de fevereiro atrai a atenção do leitor com o instigante título: qual é o propósito da pesquisa médica? Em pauta, a fragilidade do processo de construção de conhecimento na medicina.  Pode não ter sido a intenção do autor, mas as provocações contidas no texto ultrapassam as fronteiras da pesquisa médica e poderiam ser dirigidas a outros campos científicos.
Segundo o editorialista, a cada ano são investidos 160 bilhões de dólares em pesquisas na área médica. Entretanto, suspeita-se que o benefício social seja no mínimo duvidoso. Em 2009, Ian Chalmers e Paul Glasziou, em texto publicado na própria The Lancet, estimaram que 85% das pesquisas realizadas desperdiçam recursos ou são ineficientes. As deficiências abrangem quatro dimensões: a falta de relevância para médicos e pacientes, a inadequação do escopo e dos métodos, a dificuldade de acesso aos resultados, e restrições relacionadas à imparcialidade e à significância clínica. Em outras palavras, apenas 15% das pesquisas são confiáveis e relevantes.
Ainda segundo o editorialista, quando se pergunta qual o propósito da pesquisa médica, a maioria das pessoas responde sem vacilar: “Avançar o conhecimento para o bem da sociedade, para melhorar a saúde das pessoas em todo o mundo ou encontrar melhores maneiras para tratar e prevenir doenças”. A realidade, entretanto, é bem diferente. O ambiente acadêmico é um palco onde atuam diferentes grupos de interesse e as forças e pressões resultantes nem sempre conduzem aos nobres ideais citados no início do parágrafo.
O sistema de financiamento à pesquisa costuma adotar procedimentos burocráticos e enfatiza resultados de curto prazo nem sempre coerentes com as características da investigação proposta. A avaliação por pares e especialistas é repetidas vezes opaca e demorada. Empresas farmacêuticas amiúde patrocinam pesquisas em busca do máximo retorno para seu investimento. E as próprias instituições de pesquisa, de mentalidade empresarial, pensam cada vez mais em termos de desempenho, frequentemente utilizando o número de publicações científicas como indicador de sucesso.
O editorialista encerra seu texto com uma chamada para ação: chegou a hora de fazer uma reflexão crítica sobre o estado das coisas e repensar a forma como a pesquisa é conduzida: primeiro, os pesquisadores precisam se lembrar do propósito real da ciência; segundo, é necessário criar processos participativos capazes de definir que pesquisas são necessárias e o impacto esperado; terceiro, as instituições de pesquisa e as universidades devem avaliar pesquisados com base em resultados de longo prazo; e, quarto, os próprios pesquisadores devem se lembrar de por que escolheram suas carreiras. Afinal, é deles a responsabilidade de defender um ambiente propício à pesquisa.
A provocação da revista The Lancet não causa surpresa. Trata-se de mais um sinal do mal-estar resultante do estado das coisas na torre de marfim. Há tempos vêm surgindo, nas mais diversas áreas e latitudes, críticas e apelos a mudanças. As universidades modernas nutriram uma elite peculiar de pesquisadores, uma classe sofisticada, apartada do mundo ao redor e zelosa de seus pequenos privilégios. Onde ocorreu a tentativa de domesticá-la pela adoção de uma pletora de práticas de negócios parece ter gerado mais efeitos colaterais do que resultados positivos.
Reformar o sistema não é tarefa trivial. Sua missão foi desvirtuada, recursos estão sendo mal utilizados, mentes brilhantes estão sendo desperdiçadas e o impacto social fica aquém das mais justas expectativas. Nada disso, entretanto, parece ser suficiente para fazer frente a um modelo que soma pequenas inércias para criar um gigante imune e entorpecido deitado em berço esplêndido.

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